10 de novembro de 2010

Explicação do Fato - Parte I


Impossível envergonhar-me de ser homem.

Tenho rins e eles me dizem que estou vivo.

Obedeço a meus pés

e a ordem é seguir e não olhar à frente.

Minúsculo vivente entre rinocerontes

me reconheço e falho

e insisto.

E insisto porque insistir é minha insígnia.

O meu brasão mostra dois pés escalavrados

e sobram-me algumas forças: sei-me fraco

e choro.

E choro e nem assim me excedo na postura humana:

sofro o corpo inteiro, pendo e não procuro

a arma em minhas mãos.

Sei que caminho. É só.

Joelhos curvam-se, amaziam ao chão que queima

e me penetra e eu decido que não posso

envergonhar-me de ser homem.

A criança antiga é dique barrando o meu escôo

e diz que não, não me envergonhe.

Não me envergonho.

Tenho rins mãos boca orgão genital e

glândulas de secreção interna:

impossível.

No entanto sinto medo

e este é o meu pavor.

Por isso a minha vida, como o meu poema,

não é canto, é pranto

e sobre ela me debruço

observando a corcunda precoce

e os olhos banzos.


Torquato Neto

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