3 de setembro de 2010

Hoje eu conversei com Deus no ônibus

E antes mesmo daquela conversa toda cair no esquecimento, antes até de começar a digerir o almoço desta sexta-feira, tratei de escrever sobre a a conversa. Não escrever a conversa, mas SOBRE a conversa.Todos os dias vejo Deus, todos os dias converso com Ele, todos os segundos da minha vida busco estar com Ele. Mas, desta vez, resolvi registrar a conversa. Não que ela tenha sido diferente das outras, pois essa foi do mesmo jeito: tão especial como sempre é. É que dessa vez a pessoa, que me foi Deus, foi inusitada (sem mais eloquência nos adjetivos).

"Ser diferente. Este é o desafio!" De todas as coisas que absorvi daquele momento, essa foi a que mais me tocou, pois aquele momento foi diferente
. Aquela viagem matutina, onde a aparente monotonia da rotina está no seu ponto mais alto, foi mais especial.
Sentei-me na poltrona (não acolchoada) do ônibus que a mais de 400 dias utilizo para ir de casa à escola, e vice e versa. Guardei meu passe verde na carteira ao tempo em que tirava da mochila um livro que acabara de tomar emprestado na biblioteca. Sentado e lendo, entrou no ônibus uma mulher, talvez senhora. Tinha uns 30 ou 40 anos com a sabedoria de uns 30 ou 40 (temos a mania de achar que uma pessoa mais nova, quando inteligente, tem sabedoria de mais velho. E não é assim. A sabedoria é, necessariamente, da idade de quem a busca. Não há idade sábia o bastante. Tenho 17 anos com a sabedoria de 17).

Comecei a ler as primeiras crônicas do livro (de Luis Fernando Verissimo, pra variar) cujo nome é "As comédias da vida privada" quando chegou ao meu lado a mulher que acabava de entrar na lotação. Vinha com uma daquelas pastas de couro com zíper, no balanço do ônibus, quase caindo. Pedi-lhe a pasta e a pus em cima de minha mochila que estava em minhas pernas. Devo confessar que com constrangimento, já que minha intenção era dar-lhe a cadeira, porém, meio que imóvel, fiquei sentado com os olhos no livro e com os livros e os braços em cima da pasta alheia. Respondi o "obrigada" da senhora e continuava a ler, enquanto continuava a viagem...

Depois de algumas curvas e ondulações das pistas de nossa cidade e depois de duas crônicas já lidas, a mulher me pediu licenç
a. Queria olhar o livro que eu lia. Achei aquilo um tanto inconveniente. Não a parte de ela querer saber qual livro eu lia, mas o fato de ela ter pedido licença e fechar o livro nas minhas mãos sem eu ter dado-lhe a licença. Mas tudo bem. Eu não ia sair nos tapas ali com aquela senhora. Só acho que era melhor ela nem ter pedido licença (assim como eu faço às vezes)...

Terminei a terceira crônica e um sorriso raso vasou do meu rosto. Foi quando a mulher perguntou:
-" Me permita lhe perguntar uma coisa... (mais uma vez sem eu permitir-lhe) Até que ponto essas comédias lhe ajuda?"
E lá foi
minha resposta, que, como não gosto nem um pingo de falar, não foi nada pequena.
Mas como eu escrevi no começo, não quero escrever a conversa, apenas sobre a conversa.

Me chamou a atenção a minha ignorância, arrogância, insensibilidade e ins
ipiência. Ignorância por ter hesitado em dar a cadeira àquela mulher. Arrogância por achar que aquela seria mais uma daquelas pessoas chatas; filósofa, professora, educadora ou psicóloga, que, como todos aqueles que perdem a humildade ao ganharem o pedaço de "papeldiploma", se acha a dona da razão e por isso eu deveria nem dar bola pra ela. Imbecilidade por achar que filósofos, professores, psicólogos, educadores, escritores, resumindo, os intelectuais se acham donos da razão. Insipiência por deixar essas coisas todas me chamarem atenção primeiro.

Que a primeira impressão é a que fica, há tempos julgo não ser verdade (a menos que sejamos sábios o bastante para fazermos de cada impressão a primeira) . Mas aquilo que deve chamar nossa atenção primeiro em uma pessoa é o último s
entimento que ela nos transmite. Por isso comecei o texto dizendo que conversei com Deus no ônibus.

"Até onde é saudável rir da desgraça do mundo e dos outros?". Essa foi uma das perguntas que, na razoável conversa, a mulher me fez. E ficou a reflexão...
Até onde o Luis Fernando Verissimo quer que eu ria e até onde ele quer que eu atente para as coisas que ele acha triste, decepcionante, estressante e torturante neste mundo em que essas coisas são, para muitos, triviais? Até onde o humor me faz rir e até onde o que me faz ri
r é a vida real e não o humor? Até onde rir é o melhor remédio e até onde rir é melhor do que chorar?... Por quê a gente deve não chorar quando todos parecem querer que soframos? Por quê não fazer o que todos querem que façamos e por que ser do jeito que todos querem que não sejamos? Por quê acordar de manhã e sentir-se cansado, estressado, abatido, às vezes até enlouquecido, quando é aí que a incompreensão, a destruição e a corrupção do homem querem nos levar? Por quê SE fazer essas perguntas quando essas não têm respostas se a buscarmos da forma que buscamos?

Se tantos intelectuais e escritores que leio fossem realmente irônicos (no sentido destrutivo da coisa) e se achassem os donos da razão, como vejo os julgarem ser e se eles realmente não fossem preocupados com a sociedade, eles não seriam tão genero
sos e altruístas ao nos dar o seu testemunho, suas experiências e o que de bom ou mau podemos tirar delas.

Se for como Fernando P
essoa diz e a morte for só uma curva da estrada, nossa vida é uma BR: cheia de buracos, de altos e baixos, cheia de acidentes... E o inferno e o céu já começam aqui. O inferno na crueldade, na maldade, no egoísmo, na competição humana e em tudo aquilo que faz o próprio homem ser a personificação do mal. O céu na natureza divina do homem, na bondade, na vontade de ser sempre exemplo, na gratuidade, na fé, na paciência, na esperança de um mundo melhor e no amor que é a própria vida.

É o amor que me faz viver. Meu combustível é a honestidade e a sensação de que nada é capaz de abalar os muros do coração, quando ele é alicerçado no gigantesco universo do amor.É a felicidade de amar que me faz querer perpetuar minha existência, como foi o amor que fez Jesus vencer a morte. Falta agora nós vencermos a morte em que não precisamos parar de respirar para estar nela. Falta dar mais valor ao que a vida n
os dá de maravilhoso, pra poder resistir a essa tortura que não derrama nosso sangue...

É só o amor que me faz viver no otimismo, no bom humor, na certeza de que não virão dias melhores, pois melhor do que o que já estamos é impossível. O que virá do futuro é uma percepção mais humana e menos imbecil das coisas em
nossa volta. Só o amor me faz viver. O amor que é vida, o amor que é tudo, o amor que é o que faz eu ver Deus em todos. Ele que me ama como eu não posso amá-lo, Ele que é o que eu só posso ser a imagem, Ele que é pra quem eu vivo, Ele que é por quem eu amo.

Um comentário:

  1. OI,usei uma imagem daqui neste Post: http://consiliencia.blogspot.com/2009/11/uma-curva-nao-e-o-fim-da-estrada.html

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