31 de março de 2015

Ignorância Digna / Dignidade Ignorante

Foto: Osman Sağırl

A criança síria te comove e da nossa tu corres

Impelido por um amigo, de posição viva e clara, escrevo algumas palavras, tímidas, porém sinceras, acerca da discussão de muito tempo, mas que é agora o assunto do momento: a redução da maioridade penal.

Não sou especialista – nem tenho know-how para ser –, nem sou um profissional ainda, embora já dê meus primeiros passos além do diletantismo naquilo para o qual me preparo para vir a ser. Mesmo assim, penso que cabe uma opinião a mais (que, na verdade, pode se parecer a tantas outras por aí) nesse vale de discursos, ofensas e lágrimas.

“Ninguém pode ficar no meio do tiroteio”, e o tiroteio está voraz demais. Não o tiroteio das ruas e favelas, mas o tiroteio de opiniões que se apresentam. Vou tentar ser como um tiro apenas pela rapidez, pois sei que barulhento não serei.

Contra ou a favor? Mas contra ou a favor de que? E por quê mesmo? Sou contra. Contra a redução da maioridade penal. E não é porque sou Du contra. Não concebo a ideia de reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos por, pelo menos, dois motivos básicos: i) não soluciona nem ameniza o problema; e ii) causaria um inchaço ainda mais desastroso do sistema prisional.

A leitura do não especialista que sou é a de que diminuir a maioridade para 16 seria diminuir também a idade dos criminosos. Hoje em dia já é comum ver crianças de 14 anos praticando crimes hediondos (numa rápida pesquisa na grande rede encontrei várias notícias que sustentam meu ponto. Escolhi apenas esta por ser a mais recente: http://g1.globo.com/bahia/noticia/2015/03/menino-de-14-anos-mata-adolescente-de-17-por-causa-de-divida-de-r-30.html). Com a punição aos 16, crimes hediondos cometidos por crianças de idade inferior a 14 (como já é o caso deste de 11: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/policia/online/suposto-autor-de-crimes-menino-de-11-anos-e-assassinado-em-ico-1.1153562), que hoje são de nos assustar, serão vistos com maior frequência, serão comuns.

O segundo motivo é algo lógico. Ora, se adolescentes de 16 e 17 anos passarão a responder como adultos, para onde eles irão a fim de pagar suas penas? Acontece que a superlotação das carceragens já é uma realidade há tempos. Alguém ainda se lembra das super-rebeliões em Pernambuco neste ano (http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2015/01/em-2-dias-de-rebelioes-em-presidios-de-pe-numero-de-feridos-chega-72.html) ou das notícias rotineiras de superlotação na Central de Flagrantes de Teresina (http://cidadeverde.com/central-contabiliza-75-presos-sejus-ira-transferir-30-nesta-terca-feira-189251). Isso para ficar em dois exemplos apenas! Então, para onde vão os, hoje, menores de 16 e 17 anos que serão contemplados, caso vá em frente a proposta de emenda à constituição (mais remendada do mundo)?

Muitos são os outros possíveis argumentos contra a proposta, mas só gostaria de deixar esses dois que apresentei aqui, sem esquecer uma coisa que tem me parecido nessa briga toda: estamos apenas transferindo responsabilidades! A verdade é que estamos (e o ‘nós’ desinencial quer dizer nós cidadãos, pais, filhos, irmãos, cristãos, não cristãos, políticos, eleitores, professores, alunos...) perdendo a guerra contra a criminalidade graças à cultura do egoísmo – se os meus estão bem, tudo está bem – e graças à cultura do ódio – que se danem esses meninos que não querem prestar!

Apresentei dois argumentos, apresento duas possíveis soluções: i) os projetos de educação, esporte e cultura dos governos e da iniciativa privada precisam chegar às periferias – hoje eles são tão tímidos, tão segregantes, que o público-alvo que mais precisa não é contemplado com o pouco de projeto que ainda existe (ou subsiste); e ii) o aparelhamento do judiciário para que processos tramitem e tantos criminosos – traficantes e corruptos gigantes – sejam responsabilizados por seus crimes, afinal pôr uma arma na mão de uma criança é crime tanto quanto desviar uma verba que se transformaria em um campinho e uma bola de futebol ou em um violão ou em um livro de histórias em quadrinhos para armar as crianças de dignidade.

Não basta transferir a culpa! A culpa não é deles! Todo erro merece punição, mas ser punido sem a chance de aprender o que é e o que não é crime não tem lógica! Estamos perdendo a guerra porque não percebemos que cada criança que queremos mandar para cadeia poderia ser um atleta, artista, cidadão gigante do seu tempo. Não basta transferir a culpa e cidadania não se exerce só na urna! O Brasil, hoje, é o país do futuro que passou. Não destruamos os sonhos que construirão o que ainda poderemos ser.

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